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Esse era o valor do salário de Papa Francisco na Igreja Católica

Em um mundo onde lideranças religiosas muitas vezes são cercadas de privilégios e riquezas, o Papa Francisco deixou uma marca que vai além das palavras: ele optou por viver sem salário. Com seu falecimento em 21 de abril de 2025, o legado de simplicidade e compromisso com os mais pobres ganha ainda mais destaque.

Mas o que realmente significa um Papa viver sem salário? E como isso se sustenta dentro da engrenagem financeira bilionária da Igreja Católica? A seguir, mergulhamos nas escolhas pessoais de Francisco e nas complexas finanças do Vaticano — entre austeridade e tradições seculares.


Francisco: Um Pontífice de Voto Pessoal e Público de Pobreza

Desde que assumiu o pontificado em 2013, o argentino Jorge Mario Bergoglio — ou simplesmente Papa Francisco — fez questão de ser diferente. Membro da Companhia de Jesus, ele reafirmou o voto de pobreza que assumiu como jesuíta, recusando não apenas luxos, mas também o próprio salário.

“Não recebo salário. E se me oferecessem, recusaria,” afirmou no documentário Amém: Perguntando ao Papa (2023), reforçando uma postura que o acompanhou até os últimos dias.


O Vaticano Cobre Tudo: Moradia, Alimentação e Viagens

Mesmo sem remuneração formal, o Papa não vivia em necessidade. Todos os seus custos eram cobertos pela Santa Sé: moradia no Palácio Apostólico, alimentação, deslocamentos em viagens pastorais e cuidados médicos, inclusive internações de alta complexidade no Hospital Gemelli, em Roma.

A tradição de não pagar um salário ao Papa não é nova. Remonta a séculos, como símbolo da missão espiritual do pontífice — alguém que serve a fé, e não ao dinheiro. Mas, com Francisco, isso ganhou nova intensidade.


De Volta aos Pobres: Destino Solidário para Recursos Pessoais

O Papa poderia ter aceitado um salário simbólico. Estimativas sugerem que o montante poderia chegar a US$ 32.000 mensais. Francisco, no entanto, fez outra escolha: destinou essa quantia a ações sociais. Entre os exemplos mais emblemáticos, está a doação de meio milhão de dólares ao México para auxiliar migrantes em situação crítica.

Ele também supervisionava diretamente o Óbolo de São Pedro — fundo internacional alimentado por doações de fiéis, que arrecadou € 48,4 milhões em 2023. Esse recurso é voltado a causas emergenciais e humanitárias, como refugiados, vítimas de guerras e desastres naturais.


Crise nas Finanças do Vaticano: Um Contraponto à Simplicidade

Apesar do espírito de humildade que Francisco cultivava, o Vaticano enfrenta uma realidade financeira desafiadora. O déficit da Santa Sé atingiu € 83 milhões em 2023. Entre os principais motivos, estão a queda nas doações — especialmente após a pandemia — e o aumento dos custos operacionais.

Para enfrentar a crise, o Papa implementou cortes radicais. Um dos mais polêmicos foi a redução de 10% nos salários de cardeais, que passaram a receber € 5.000 mensais. Além disso, imóveis ocupados por membros da Cúria Romana passaram a ser cobrados com aluguel, algo inédito até então.


A Igreja e Seu Império Econômico: Transparência em Construção

A Igreja Católica detém um dos patrimônios mais expressivos do mundo, estimado em cerca de € 4 bilhões. São imóveis históricos, investimentos e, claro, os Museus Vaticanos, que sozinhos geram mais de € 100 milhões anuais em receitas com turismo.

Porém, essa vastidão econômica sempre foi alvo de críticas. A falta de transparência nos investimentos e a ausência de auditorias externas colocavam a gestão da Igreja sob suspeita. Francisco tentou mudar isso: vetou aplicações em indústrias como armamentos e pornografia, alinhando os investimentos à doutrina social cristã.


Um Papa Fora do Comum: Entre Contrastes e Coerência

A decisão de não receber salário foi apenas uma das muitas ações com as quais Francisco demonstrou que sua liderança ia além dos discursos. Dormir em uma residência simples, cozinhar sua própria comida no início do papado e usar um veículo modesto em vez de limusines foram atitudes que inspiraram milhões.

Ainda assim, o paradoxo é inevitável: o Papa da humildade viveu rodeado por uma estrutura milenar de poder e riqueza. Seu desafio foi conciliar a grandeza da instituição com a urgência dos pobres — e, ao que tudo indica, ele não apenas tentou, mas conseguiu transformar parte dessa cultura.


Legado e Reflexão

Com sua morte, o mundo não perde apenas um líder religioso, mas uma figura que desafiou as convenções de dentro para fora. A história de Francisco permanece como um chamado — não para renegar os recursos, mas para redirecioná-los.

Se sua ausência será sentida nos corredores do Vaticano, seu exemplo ecoará por muito mais tempo nos corações de quem acredita que humildade é, sim, uma forma poderosa de liderar.


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