POLÍTICA

Nesta quinta-feira Dino mandou PF abrir novo inquérito contra Bolsonaro por ma… Ler mais

O ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou na última quarta-feira (17) a abertura de inquérito contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), três de seus filhos e outros 20 aliados políticos e empresariais. A decisão se baseia no relatório final da CPI da Covid, elaborado em 2021, que apontou indícios de crimes contra a administração pública, incluindo fraudes em licitações, superfaturamento e desvio de recursos durante a pandemia. Com a decisão, a Polícia Federal (PF) terá 60 dias para aprofundar as apurações, podendo solicitar prorrogação do prazo caso julgue necessário.

No despacho, Dino destacou que a investigação parlamentar cumpriu os requisitos legais para justificar a abertura de inquérito. O relatório da CPI indicava, entre outros pontos, contratos firmados com empresas de fachada, irregularidades em compras emergenciais e práticas que teriam exposto a população a riscos desnecessários durante o enfrentamento da pandemia. “A investigação parlamentar apontou indícios de crimes contra a Administração Pública, notadamente em contratos, fraudes em licitações, superfaturamentos, desvio de recursos públicos e assinatura de contratos fictícios”, escreveu o ministro em sua decisão.

A medida do STF surge dois anos após a Polícia Federal solicitar a transformação das conclusões da CPI em inquérito. Embora o relatório tenha sido entregue à Procuradoria-Geral da República (PGR) ainda em 2021, o órgão arquivou os pedidos de indiciamento, alegando falta de elementos para dar continuidade às acusações. Desde então, a PF buscou acesso integral às provas levantadas pela comissão e concluiu que havia material suficiente para seguir com as investigações, movimento agora respaldado pela decisão de Dino.

Entre os 24 nomes incluídos no inquérito estão figuras de destaque do bolsonarismo no Legislativo, como o senador Flávio Bolsonaro, os deputados federais Eduardo Bolsonaro, Ricardo Barros, Carla Zambelli e Bia Kicis, além do vereador carioca Carlos Bolsonaro. Também figuram na lista ex-integrantes do governo, como o ex-chanceler Ernesto Araújo e o ex-ministro Onyx Lorenzoni, além de empresários conhecidos, como Luciano Hang, dono da Havan, e Carlos Wizard Martins, fundador da rede de idiomas Wizard. Personalidades ligadas à militância digital, como Allan dos Santos, Oswaldo Eustáquio e Bernardo Küster, também serão investigadas.

O contexto político da decisão é significativo. O despacho de Flávio Dino foi publicado apenas dois dias depois de a Câmara dos Deputados aprovar, em primeiro turno, a chamada PEC da Blindagem, que limita a possibilidade de prisões e processos criminais contra parlamentares. Pela proposta, deputados e senadores só poderão ser processados com autorização da própria Casa legislativa, medida que, se confirmada pelo Senado, poderá impactar diretamente a tramitação de futuros processos envolvendo congressistas investigados. Dos 24 nomes na nova frente de apurações, sete possuem mandato parlamentar em vigor.

A CPI da Covid, instalada em abril de 2021, se tornou um dos momentos mais tensos do governo Bolsonaro. Foram 67 reuniões ao longo de seis meses, nas quais ministros, técnicos e empresários prestaram depoimentos sobre a condução da crise sanitária. O relatório final, produzido pelo senador Renan Calheiros (MDB-AL), apontou falhas graves na compra de vacinas, na estratégia de enfrentamento da pandemia e no episódio do colapso de oxigênio em Manaus. O documento citou o nome de Bolsonaro mais de 80 vezes, atribuiu a ele a prática de 10 crimes e chegou a defender que fosse denunciado por crimes contra a humanidade.

Na época, a CPI também sugeriu o indiciamento de seis ex-ministros, seis deputados, um senador, além de médicos, empresários e representantes de empresas investigadas. Entre as acusações estavam a suposta omissão na aquisição de imunizantes, a defesa de tratamentos sem eficácia comprovada e a exposição deliberada da população ao risco de infecção em massa. Embora a PGR tenha optado por arquivar grande parte das recomendações, a insistência da Polícia Federal em dar continuidade às investigações resultou na decisão de Dino, que agora abre um novo capítulo em um dos processos mais polêmicos da história recente do país.

Com a abertura do inquérito, caberá à PF reunir elementos adicionais para confirmar ou afastar as suspeitas levantadas pela CPI. A investigação deve analisar contratos, ouvir testemunhas e buscar indícios concretos de práticas ilícitas apontadas no relatório. Ao mesmo tempo, o caso reacende debates políticos e jurídicos em Brasília, especialmente diante da aprovação da PEC da Blindagem e da polarização que ainda marca o cenário político nacional. A decisão do STF, portanto, coloca novamente no centro das atenções os desdobramentos da pandemia e a atuação do governo Bolsonaro, com possíveis repercussões tanto no campo judicial quanto no eleitoral.